terça-feira, 14 de julho de 2015

14/07 Algumas palavras sobre as novas notas explicativas

Com a emissão da OCPC -07, no final de 2014, e sua aprovação por parte da CVM e do CFC, temos um novo conjunto de diretrizes para a elaboração das notas explicativas no Brasil, já a partir do exercício de 2014. 

Essa orientação é pioneira no mundo, e olha que o Iasb, o Fasb, o Efrag e vários países vêm trabalhando na matéria! Essa nossa orientação foi elaborada praticamente à base do que já consta nas Normas Internacionais de Contabilidade, aliás, adotadas no Brasil desde 2010. 

O que descobrimos é que não vínhamos lendo cuidadosamente o que consta nesses documentos e não vínhamos também dando a devida atenção e também não interpretando de forma adequada muitos dos seus textos.

Vamos aos pontos mais relevantes e que constam da citada OCPC:

Já está dito, há anos, na Estrutura Conceitual, que o objetivo das demonstrações contáveis “é fornecer informações contábil-financeiras acerca da entidade que reporta essa informação que sejam úteis a investidores existentes e em potencial, a credores por empréstimos e a outros credores”. 

E “informações úteis são aquelas que são relevantes”, e “Informação contábil-financeira relevante é aquela capaz de fazer diferença nas decisões que possam ser tomadas pelos usuários.” 

Se o ativo imobilizado é 2% do ativo total num banco, por que mostrar sua movimentação no ano, evidenciando a conciliação entre o saldo inicial e o final? Por que 20 linhas para fazer sua discriminação, suas taxas de depreciação por natureza de imobilizado etc? 

Ah! Talvez alguns digam que isso é exigido pelo Pronunciamento do Imobilizado que diz que “no mínimo” devem ser dadas tais e tais informações (isso ocorre em inúmeros Pronunciamentos).

Mas acontece que as próprias normas dizem que “qualquer informação específica requisitada por qualquer Pronunciamento, Interpretação ou Orientação que não seja relevante não deve ser divulgada”. Ou seja, obediência cega, sem julgamento, é obediência não inteligente (falar de outra forma pode ficar feio...). 

E mais, que só as informações relevantes devem ser dadas, já que as não relevantes são capazes de, na verdade, distrair o leitor e/ou confundi-lo. 

Logo, o que não for relevante não deve ser colocado nas notas ou individualmente nas demonstrações (o mais simples talvez seja definir não o que é relevante, mas sim o que não é relevante, como dizia um falecido professor: “informação irrelevante é aquela com a qual ou sem a qual o mundo gira tal e qual”). 

Ou seja, se não faz diferença para o leitor, não se coloca nas notas ou não se individualiza no balanço, no resultado, mesmo que exigido pela norma. Deve-se sempre interpretar todas as exigências de divulgação das normas do Iasb, do CFC, da CVM etc. com o complemento: “desde que seja relevante”. 

Lembrar que relevância inclui materialidade e outros aspectos qualitativos. Ou seja, todos os números que são grandes perante o tamanho da empresa são relevantes, mas números pequenos podem, em certas situações, também ser relevantes, mesmo que imateriais (pequenos). 

E os números imateriais não relevantes devem ser englobados em outros, nunca dados individualmente. E isso tudo vale não só para as notas, mas também para as próprias demonstrações.

Por exemplo, se a empresa possui um ativo total de R$ 100 milhões, um ativo imobilizado de R$ 40 milhões e um ativo intangível de R$ 50 mil, jamais deve-se explicitar esse intangível, devendo ele ser englobado em “outros ativos não circulantes” ou até mesmo dentro do imobilizado (no máximo diz-se, na nota do imobilizado, que este engloba valores imateriais de intangíveis). 

A não ser que esse intangível seja a patente que é o ativo que, apesar de estar registrado por esse custo tão pequeno, representa o que de mais importante a empresa tenha em seus recursos produtores de lucro.

Ou seja, só se identifica individualmente esse intangível, no balanço ou na nota, para evidenciar do que se trata se for efetivamente relevante essa informação para o usuário. 

Mais, as normas (e até a lei nossa das S.A., desde 1976!) dizem que só se deve colocar em notas aquilo que for específico da empresa. E isso vale inclusive para as notas onde se explicam as principais práticas contábeis seguidas pela empresa. E só devem constar dessa nota as descrições das práticas que, além de específicas da empresa, sejam, obviamente, significativas (termo usado pela lei, inclusive). 

Não se deve simplesmente reproduzir o que já está nos documentos. E muito menos gastar 50 linhas falando de instrumentos derivativos para depois dizer que a empresa não os utiliza!!! Ou falar de propriedade para investimento se a empresa jamais investiu neles. 

Obrigatório é dizer sobre as práticas contábeis quando há uma opção, qual a adotada. Isso não pode deixar de ser dito. Deve apenas ser mencionado, por exemplo, que “a companhia observa as práticas contábeis pertinentes relativas aos estoques, adotando o custo médio ponderado móvel para sua avaliação”. Ponto final. 

Para que explicar o que é custo médio ponderado móvel? Ou, se os estoques são irrelevantes porque é uma empresa de prestação de serviços (um grande escritório de Contabilidade, por exemplo), nem precisa (nem deve, na verdade), falar de tais estoques nas notas.

Outra coisa obrigatória: se houve uma mudança de prática contábil, aí sim é necessário explicar qual a nova e todos os efeitos (relevantes) de sua adoção. Para as demais práticas contábeis que não sejam específicas, ou relativas a itens que não sejam relevantes, basta uma observação geral de que “as demais práticas contábeis utilizadas são as contidas nas Normas Brasileiras e/ou Internacionais de Contabilidade” (partindo do pressuposto, é claro de que essa seja a verdade!). 

Mais um ponto: a linguagem precisa ser a menos técnica e rebuscada possível, devendo se aproximar do que é o entendimento médio de um leitor razoavelmente instruído em negócios e em Contabilidade. Apenas quando absolutamente inevitável deve ser utilizado linguajar técnico específico da entidade ou do setor. É conveniente considerar, neste caso, a apresentação de glossário completo e conciso junto com as demonstrações.

“As notas explicativas devem ser apresentadas, tanto quanto seja praticável, de forma sistemática. Cada item das demonstrações contábeis deve ter referência cruzada com a respectiva informação apresentada nas notas explicativas” e a ordem pode ser “a que a administração da entidade considerar como a mais adequada”. 

Agora, um dos raros pontos não mencionados especificamente nas Normas Internacionais e Brasileiras de forma explícita, mas sim de forma implícita, mas lembrada na OCPC-07: “está sempre presente a necessidade de ênfase às informações relativas a todos os temas que possam representar riscos para a entidade.”

Finalmente, já que estamos ocupando demasiado espaço, agora sim uma novidade: “a administração da entidade deve, na nota de declaração de conformidade, afirmar que todas as informações relevantes próprias das demonstrações contábeis, e somente elas, estão sendo evidenciadas, e que correspondem às utilizadas por ela na sua gestão”. Espera-se que os administradores todos leiam, e muito bem, o que assinam! 

Por Eliseu Martins - Professor Notável 2014 (prêmio CRCSP), Professor Emérito da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo - bacharel, doutor e livre-docente pela FEA-USP

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