segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Reforma tributária pode recuperar a economia

O sistema desenvolvimentista, presente na Constituição de 1988, admitiu que o Brasil não possuía condições para garantir a plenitude do bem-estar social, mas estabeleceu o objetivo de que nossa ordem econômica permitisse crescimento sem perder de vista os benefícios sociais.

A ideia era que o desenvolvimento econômico, pautado na atuação dos agentes privados regulados pelo Estado, sustentasse um modelo de organização com ênfase na seguridade social, trazendo igualdade e garantindo ao cidadão o direito de ter uma boa aposentadoria, além de contar com saúde e educação de qualidade. Porém, passados quase trinta anos da promulgação da Constituição Federal, o sistema econômico almejado não foi alcançado por diversos motivos, dentre os quais está a organização dos tributos no País.

Naquele momento, o texto constitucional recepcionou o Código Tributário Nacional (CTN) – Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 -, fixando as normas gerais de direito tributário, que apesar de se tratar de uma legislação muito bem elaborada, necessita de modernização após cinquenta anos.

Estamos diante de outro momento crucial, no qual uma mudança técnica seria capaz de estimular o consumo

Os países europeus que chegaram ao estado do bem-estar social pleno possuem uma carga tributária superior à brasileira. O problema é que os tributos no Brasil são mal distribuídos, incidindo demasiadamente sobre o consumo, atrapalhando a produção nacional.

A criação do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) é almejada há tempos, pois unificaria diversos tributos, simplificando o recolhimento para diminuir a sonegação, o que proporcionaria transparência ao consumidor e segurança jurídica aos empreendedores.

Além disso, a redistribuição das competências tributárias traria uma menor diversidade de leis, centralizando o poder de legislar na União, que dividiria com os Estados e municípios a capacidade ativa de cobrança, arrecadação e fiscalização dos tributos.

A intenção de concentrar a tributação sobre o patrimônio na esfera municipal é válida, contando com auxílio federal, uma vez que grandes patrimônios se distribuem por diversas regiões, estando a Receita Federal melhor estruturada para uma fiscalização desse porte.

Por outro lado, os Estados enfrentariam o fim do ICMS, bem como as mudanças no IPVA e ITCMD, passando a contar com o IVA, que seria arrecadado por meio da criação de um novo órgão, que agregaria todos os Fiscos estaduais e do Distrito Federal. Neste cenário, teríamos o fim da chamada guerra fiscal, travada com a concessão de benefícios para atrair investimentos privados.

A política de desonerações para alguns setores da economia foi marcada pela renúncia fiscal e se mostrou ineficaz ao não reduzir efetivamente o volume tributário, impactando no déficit das contas públicas, o que contribuiu para a recessão ao invés de gerar crescimento econômico. Portanto, uma reforma ampla precisa minimizar a carga sobre o consumo com o IVA, aquecendo a economia. Todavia, deve-se equilibrar a arrecadação por meio da tributação sobre a renda e patrimônio, de forma justa, respeitando a capacidade contributiva.

Diante disso, a reformulação do Imposto sobre a Renda e Proventos precisa ser bem planejada, não podendo de forma alguma onerar ainda mais o trabalhador de baixa renda. Ademais, a incorporação da CSLL pelo IRPJ se mostra uma boa opção para o equilíbrio fiscal, lembrando que todas as alterações devem respeitar os princípios da legalidade e anterioridade.

Para diminuir as desigualdades regionais, é importante que a arrecadação seja dividida entre todos os entes federativos, evitando-se tributos não partilháveis para incentivar um crescimento uniforme da sociedade. Para tanto, deve haver um período de transição para este novo modelo, respeitando a divisão de valores que ocorre atualmente, a fim de impedir que no início haja perdas consideráveis no âmbito federal, estadual e municipal.

Por fim, é temerária a proposta de criação de uma contribuição incidente sobre a movimentação financeira, apresentada como alternativa para desonerar a folha de salários, já que esta medida pode causar um aumento na carga tributária. Em que pese a pretensão de gerar novos postos de trabalho, é preciso analisar esta proposta em face da desoneração que criou a CPRB, mas causou prejuízo para a União e acabou contestada judicialmente.

Discussões filosóficas à parte, a situação econômica e política atual lembra o que o país vivia antes do plano real, aquele que acabou com a hiperinflação e trouxe estabilidade para as duas décadas seguintes. Por isso, não se trata de um devaneio afirmar que uma reforma tributária substancial poderá ter efeito semelhante ao do programa que criou uma nova moeda, já que estamos diante de outro momento crucial, no qual uma mudança técnica seria capaz de estimular o consumo, trazendo crescimento e investimento, recuperando a economia para voltarmos a buscar o chamado Estado Social.

por Rodolfo Henrique Rodrigues da Silva é advogado especialista na área tributária, sócio da Roncato Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

Fonte : Valor

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