sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

15/02 Tributação inteligente


Uma política tributária eficaz, que garanta receitas domésticas adequadas, é determinante para a capacidade de um país praticar políticas desenvolvimentistas. Mas as receitas tributárias na maioria dos países em desenvolvimento são baixas, impedindo o progresso rumo a um desenvolvimento econômico mais sustentável, equilibrado e inclusivo, que possa melhorar a saúde pública e aumentar os padrões de vida.

Embora receitas não tributárias possam contribuir significativamente para o Produto Interno Bruto (PIB) total de alguns países, as proporções médias de impostos e PIB em países de rendas baixa e média baixa são de aproximadamente 15% e 19%, respectivamente -, portanto significativamente inferiores à média superior a 35% na OCDE. Para financiar projetos de desenvolvimento, os países pobres e de renda média baixa precisam elaborar e implementar estratégias tributárias para aumentar a receita doméstica.

Isso implica abandonar o dogma segundo o qual os impostos só devem ser aumentados quando necessário. Essa postura presume que alíquotas mais baixas aumentam a proporção impostos e PIB garantindo melhor cumprimento da legislação tributária e defende a tributação indireta (por exemplo, impostos sobre valor agregado), com o objetivo de ampliar a base tributária, abrangendo pessoas com renda modesta.

A mobilidade do capital aumenta as oportunidades de evasão fiscal, uma vez que a capacidade das autoridades tributárias de monitorar a renda de seus cidadãos no exterior é limitada, e governos e instituições financeiras podem ocultar informações relevantes

Por outro lado, a tributação direta incidente sobre as empresas e pessoas tendeu a diminuir - apesar da alegação discutível de que menor tributação direta assegura investimento e crescimento. Como resultado, a relação impostos/PIB na maioria dos países na África subsaariana e na América Latina estagnou ou mesmo caiu.

Em muitos países em desenvolvimento, a receita tributária total provém de três fontes principais: impostos domésticos sobre bens e serviços (impostos sobre vendas e impostos "punitivos"), impostos diretos (principalmente sobre empresas), e, mais importante, os impostos sobre o comércio exterior (tarifas de importação).

Em contraste, nos países de alta renda, o imposto de renda (principalmente sobre pessoas físicas) é a maior proporção das receitas tributárias (cerca de 36%), enquanto os impostos nacionais sobre bens e serviços e sobre a seguridade social respondem, cada um, por pouco mais de 25%. Além disso, a participação dos impostos sobre o comércio exterior é baixa.

Os governos precisam também empenhar-se em melhorar o respeito à legislação tributária e reduzir a evasão, o que exige limitar a autoridade discricionária da autoridade tributária.

A fim de aumentar a participação dos impostos sobre a renda pessoal na receita total, os países em desenvolvimento já estão melhorando suas administrações tributárias de formas inovadoras, especialmente para alcançar cidadãos difíceis de serem tributados. Mais pode ser feito: cada indivíduo que possui uma casa ou um veículo, é membro de um clube, tem um cartão de crédito, passaporte, carteira de motorista ou outro documento de identidade ou é assinante de um serviço de telefonia, pode ser obrigado a apresentar sua declaração de renda.


Além disso, impostos "punitivos" sobre o consumo são uma fonte conveniente de receita nos países em desenvolvimento, pois incidem principalmente sobre produtos como álcool, cigarros, gasolina, veículos e peças de reposição, que envolvem poucos produtores, grandes volumes de vendas, demandas relativamente inelásticas e fácil monitoração. Impostos especiais podem ser cobrados quando os bens deixam uma fábrica ou chegam a determinado porto, o que simplifica a medição, o recolhimento e a monitoração, garantindo assim abrangência e limitando a evasão. Mas, apesar de sua base sólida e baixos custos administrativos, os impostos especiais sobre o consumo representam atualmente menos de 2% do PIB em países de baixa renda, em comparação com cerca de 3% em países de alta renda.

Os países em desenvolvimento também precisam buscar compensar as consequências da globalização. Por exemplo, a mobilidade do capital aumenta as oportunidades de evasão fiscal, uma vez que a capacidade das autoridades tributárias de monitorar a renda de seus cidadãos no exterior é limitada, e alguns governos e instituições financeiras ocultam sistematicamente informações relevantes. Se os dividendos, juros, royalties e taxas de administração não são tributados no país em que são pagos, eles podem mais facilmente passar despercebidos no país de residência. De fato, alguns países - entre eles os EUA - não aplicam impostos sobre o rendimento de grandes depósitos bancários mantidos por estrangeiros não residentes.

A globalização também pode facilitar evasão fiscal legal. Por exemplo, as companhias multinacionais empregam métodos como manobras contábeis envolvendo bens, serviços e recursos transferidos entre filiais ou subsidiárias de uma única empresa para minimizar o imposto devido sobre os lucros de operações internacionais.

Finalmente, a concorrência internacional por investimentos estrangeiros diretos pode levar governos a reduzir as alíquotas de impostos e a ampliar concessões beneficiando investidores estrangeiros. Em vista de evidências de súbitas saídas de capitais em resposta a certas mudanças de política tributária, os governos mostram-se relutantes em aumentar as alíquotas de imposto sobre a renda - que caíram acentuadamente desde o fim dos anos 1970 - ou dos impostos sobre dividendos e juros, por temer fugas de capitais. Mas, como concessões tributárias diretas têm pouco ou nenhum efeito sobre as trajetórias dos investimentos internacionais, que dirá sobre atrair esses fluxos, elas constituem uma perda desnecessária de receita.

Políticas do tipo "empobrecer o vizinho" produzirão perdas de receitas para todos os países em desenvolvimento, ao minar a possibilidade de um desenvolvimento equilibrado, inclusivo e sustentável. Os ministérios das finanças dos países em desenvolvimento e as autoridades tributárias precisam cooperar mutuamente com seus contrapartes na OCDE para eliminar brechas existentes e estabelecer políticas tributárias eficazes que satisfaçam seus interesses compartilhados. Tendo em vista que o aumento da dívida pública em todo o mundo vem criando restrições fiscais (reais e imaginárias) sobre a recuperação econômica mundial, tal cooperação é mais urgente do que nunca. (Tradução de Sergio Blum).

por Jomo Kwame Sundaram é secretário-geral adjunto de Desenvolvimento Econômico da ONU e Coordenador de Pesquisas do G-24. Copyright: Project Syndicate, 2013.


Fonte: Valor Econômico
Via Fenacon

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