terça-feira, 24 de maio de 2016

24/05 Receita Federal do Brasil esclarece questões relacionadas à compensação

Recentemente veio a público a Solução de Consulta 29/COSIT/SRF, segundo a qual “como regra geral, desde que observadas as restrições previstas na legislação vigente, os débitos próprios relativos a tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal podem ser compensados com os créditos relativos a tributos administrados pela Receita Federal reconhecidos por decisão judicial transitada em julgado, mesmo que essa decisão tenha permitido apenas a compensação com débitos de tributos da mesma espécie”.

A Solução de Consulta em comento traz importante esclarecimento, embora mantenha restrições que atualmente não fazem mais sentido.

A compensação é forma de extinção do crédito tributário segundo o disposto nos artigos 156, II e 170 do Código Tributário Nacional. Referida modalidade de extinção do crédito tributário ocorre na medida em que o sujeito passivo da obrigação tributária é credor e também devedor do Estado. Para a sua efetivação a compensação depende de autorização legal.

Em 1991, a Lei 8.383/91 inaugurou no sistema jurídico tributário nacional a compensação realizada pelo sujeito passivo da obrigação tributária. Em seu artigo 66 possibilitou a compensação sem prévia autorização da Secretaria da Receita Federal, mas assim o fez apenas em relação aos tributos da mesma espécie (§1º do mesmo dispositivo).

Posteriormente, a Lei 9.430/96 permitiu em seu artigo 74 a compensação “para a quitação de quaisquer tributos e contribuições sob sua administração", desde que houvesse prévia autorização da Secretaria da Receita Federal.

Em 2002, a Lei 10.637/02 criou a compensação mediante declaração realizada pelo próprio contribuinte e manteve a possibilidade de compensação com tributos e contribuições de espécies distintas, desde que administrados pela Secretaria da Receita Federal.

A partir disso, o Superior Tribunal de Justiça declarou, sob a sistemática repetitiva, que “após o advento do referido diploma legal, tratando-se de tributos arrecadados e administrados pela Secretaria da Receita Federal, tornou-se possível a compensação tributária, independentemente do destino de suas respectivas arrecadações, mediante a entrega, pelo contribuinte, de declaração na qual constem informações acerca dos créditos utilizados e respectivos débitos compensados, termo a quo a partir do qual se considera extinto o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação, que se deve operar no prazo de 5 (cinco) anos” (REsp 1137738/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 09/12/2009, DJe 01/02/2010 – Submetido ao rito do Art. 543-C do CPC).

Em 2007, a Lei 11.457/2007 unificou a administração dos tributos federais e das contribuições da previdência social sob o pálio da denominada “Super-Receita”. Apesar de manter a possibilidade de compensação entre tributos federais de espécies distintas, a referida lei excepcionou desse procedimento as contribuições sociais previstas no artigo 11, ‘a’, ‘b’ e ‘c’ da Lei 8.212/1991 (destinadas à seguridade social) no parágrafo único de seu artigo 26. Aquelas contribuições apenas poderiam ser compensadas com indébitos de mesma natureza.

A solução de consulta ora noticiada veio esclarecer que as sentenças transitadas em julgado posteriormente à Lei 10.637/2002 — mesmo na hipótese de terem autorizado apenas a compensação entre tributos da mesma espécie — poderiam ser utilizadas pelos contribuintes para a compensação com débitos próprios relativos a quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal. Prevaleceu, assim, a aplicação da norma contida em lei a despeito de restrição eventualmente estabelecida em sentença. Tal se justifica na medida em que o contribuinte pode ter requerido o reconhecimento do seu indébito em juízo de forma mais restritiva antes da alteração legislativa que veio a permitir a compensação ampliada. A alteração na legislação e no procedimento de compensação poderia, portanto, ser aplicada posteriormente.

A Solução de Consulta manteve, no entanto, a vedação à compensação de tributos administrados pela SRF com as contribuições sociais previstas no artigo 11, ‘a’, ‘b’ e ‘c’ da Lei 8.212/1991. O dispositivo trata daquelas contribuições para financiamento da seguridade social incidentes sobre a folha de salário das empresas, sobre o rendimento dos empregadores domésticos e dos trabalhadores.

Ocorre que tal impedimento é questionável.

Isso porque a Lei 11.457/2007, em seu artigo 2º, criou a denominada “Super-Receita”, transferindo a administração das contribuições previdenciárias à Receita Federal. Considerando que a administração de todas essas exações encontra-se desde então centralizada, deixou de existir impedimento de ordem prática à realização das aludidas compensações.

Além disso, a vedação à compensação nessa hipótese manteria uma situação anti-isonômica entre o Fisco e contribuinte. Isso porque ao contribuinte seria vedado compensar seus créditos tributários não previdenciários com aquelas contribuições, mas a administração poderia fazê-lo de ofício na hipótese inversa, segundo o artigo 7º, § 2º do Decreto-Lei 2.287/86.

Por fim, seria possível sustentar que a única proibição contida no parágrafo único do artigo 26 da Lei 11.457/2007 estaria relacionada à utilização do sistema de compensação por declaração do próprio contribuinte sob condição resolutória. Porém, não haveria vedação à compensação realizada por intermédio de requerimento ao Fisco ou de ofício (artigo 7º, § 2º do Decreto-Lei 2.287/86). Prova disso seria a revogação do artigo 89, § 2º da Lei 8.212/91, que negava a possibilidade de compensação entre contribuições previdenciárias e tributos diversos, pela Lei 11.941/09.

Em suma, apesar do correto entendimento demonstrado no que tange à interpretação das sentenças transitadas em julgado posteriormente à Lei 10.637/02, a Secretaria da Receita Federal perdeu uma boa oportunidade para assegurar o direito à compensação de créditos/débitos relativos às contribuições previdenciárias com outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil.


por Daniel Corrêa Szelbracikowski é especialista em Direito Tributário e associado da Advocacia Dias de Souza. Mestrando em Direito constitucional pelo IDP.

Fonte: Conjur

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