segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

07/01 Contabilidade criativa veio para ficar e tem riscos


O termo é correntemente utilizado, hoje, quando se faz referência aos subterfúgios encontrados pelo governo federal para produzir superavit fiscais não condizentes com o real esforço praticado.

Manobras fiscais do governo aumentam aposta de inflação elevada
Artifícios contábeis criam constrangimento em equipe econômica do governo

Essa estratégia de fabricação de esforços primários ganhou força no bojo de uma política macroeconômica mais intervencionista, que já vem sendo adotada desde o segundo governo Lula.

A maquiagem contábil é promovida por meio de um conjunto de instrumentos adotados com o único objetivo de fazer parecer que o pilar da responsabilidade fiscal, nos mesmos padrões que foram delineados ao final dos anos 1990, continua em pé.

Primeiro, adotou-se a diretriz de flexibilizar as metas de superavit primário fixadas na Lei de Diretrizes Orçamentárias, sem anunciar sua efetiva redução. Simplesmente autorizou-se que todo o orçamento fixado para o PAC fosse descontado do compromisso oficial.

Na prática, em 2009, 2010 e 2012 (a confirmar no resultado fechado a ser divulgado ao final deste mês), o governo abateu volumes significativos de gastos. É como se não tivesse realizado as despesas.

A segunda medida, já em 2010, foi mais pontual, mas não menos importante. Ficou conhecida como "manobra contábil da Petrobras".

O governo ampliou seu resultado primário por meio da contabilização de receitas fabricadas no bojo da cessão onerosa das reservas do pré-sal à Petrobras.

Isto é, mesmo muito distante do período de início das atividades de exploração desse recurso natural, a União já garantiu que 0,8% do PIB fosse registrado como receita primária, ajudando a elevar o pífio resultado daquele ano.

A outra linha de medidas criativas concentrou-se na rubrica de dividendos pagos à União pelo BNDES, principalmente, mas também pelos demais bancos federais.

Emitem-se títulos públicos para o banco, que os monetiza e empresta às empresas privadas a juros módicos. Com a ampliação do volume de crédito, aumentam-se os resultados obtidos e, portanto, os dividendos pagos.

A novidade editada pelo governo, no último dia do ano passado, envolve o Fundo Soberano do Brasil (FSB). Criado pela Fazenda para ampliar as possibilidades de atuar paralelamente ao BC no mercado cambial, acabou se transformando em reserva fiscal.

Dado o alinhamento da autoridade monetária aos objetivos de manter o câmbio mais depreciado, o instrumento passou a ter importância secundária para o fim a que se propunha.

Vislumbrando que a meta não seria cumprida, o governo resolveu utilizar-se do amplo objetivo fixado, em lei, para o FSB, e sacar parte dos recursos argumentando se tratar de "política de mitigação dos efeitos do ciclo econômico".

A contabilidade criativa distorce a política fiscal, em prejuízo da transparência e do princípio constitucional da publicidade, que deveria pautar as ações da administração pública. Os riscos poderão se transformar em custo em prazo não tão longo.

FELIPE SALTO é especialista em finanças públicas da Tendências Consultoria e professor do master in business economics da FGV/EESP

Editoria de Arte/Folhapress


Fonte: Folha de S. Paulo

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