quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Funrural – fim da segurança jurídica e da clássica tripartição do Poder?

O próximo julgamento do caso do Funrural, ainda sem definição da data, é a oportunidade dos ministros do Supremo Tribunal Federal de evitar aquele que pode ser um dos maiores equívocos na jurisprudência da Corte. Isso porque o colegiado pode ter sido levado ao erro pelo novo ministro relator do caso, Alexandre de Moraes, que inovou e criou uma nova regra de incidência da contribuição. A iniciativa, que beneficia a arrecadação do governo, prejudica a segurança jurídica do país.

No seu voto, o relator invade a tripartição dos poderes, cria regras que não existem, completamente incoerentes com o ordenamento jurídico. O ministro distorceu o propósito explícito que o legislador ordinário estabeleceu para o Funrural, pois entendeu que a Lei 10.256/01 instituiu o Funrural para o empregador rural pessoa física quando na verdade o texto legal fala de substituição de uma base de incidência da contribuição por outra. E o problema é que a possibilidade de tal substituição só passou a ser prevista na Constituição dois anos depois, por meio de uma Emenda Constitucional, a qual determinava que a opção só poderia ser dada por meio de lei própria.

A tal lei prevendo que empresas pudessem mudar a base de incidência só chegou em 2011, no governo da presidente Dilma Rousseff, para beneficiar empresas urbanas de uso de mão de obra intensiva que puderam escolher entre alíquotas incidentes sobre a folha de pagamentos ou sobre a receita bruta. E mesmo nessa lei – e até hoje em nenhuma outra -, o setor rural sequer foi contemplado.

Parece que o ministro novato, em apenas 8 dias no cargo, uma vez que o julgamento ocorreu no dia 30 de março e tomou posse no dia 22, chegou achando que na sua nova função pública valia também fazer as vezes de legislador. Além desse papel duplo de juiz-legislador,  algo muito além do que qualquer outro ministro tenha ousado ir, Alexandre de Moraes aproveitou, em sua criação legislativa, dispositivos que a própria Corte, por unanimidade, em 2010 e 2011 já havia declarado inconstitucional. Nesse ponto, entendeu que os dispositivos declarados inconstitucionais ainda não haviam sido suspensos pelo Senado Federal, e como passaram a estar de acordo com a nova Constituição alterada pela Emenda número 20 de 1998, criou esse Frankenstein legislativo. A decisão assusta o setor rural brasileiro que não tem como absorver essa dívida ao mesmo tempo que aterroriza o meio jurídico pois, para que haja mínima segurança e coerência do ordenamento jurídico, não é possível que norma inconstitucional possa ser reputada constitucional em razão de superveniente alteração do texto da Constituição Federal.

Com isso, o ex-ministro da Justiça do governo Temer, ao se tornar ministro-legislador, entrega de bandeja uma arrecadação artificial ao atual governo, e para a sociedade oferece uma das mais excêntricas decisões da sua história e a sensação de que doravante, caso não seja modificada essa decisão, reinará a mais absoluta insegurança jurídica, onde juiz pode fazer as vezes de legislador e lei inconstitucional pode ser ressuscitada a critério da cabeça do juiz.  

* O advogado Marcos Roberto de Melo atuou no julgamento do Recurso Extraordinária 718.874 em favor da Associação Nacional de Defesa dos Agricultores Pecuaristas e Produtores da Terra.

Marcos Roberto de Mel – advogado e sócio do escritório Melo, Salomé e Ambrósio Advogados

Fonte: Jota

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