sábado, 23 de julho de 2016

Programa de repatriação de ativos: aderir ou não?

O Governo Federal instituiu através da Lei 13.254/16, devidamente regulamentada pela Instrução Normativa 1.627/2016, que trata do Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária de recursos, bens ou direitos de origem lícita, não declarados ou declarados incorretamente, remetidos, mantidos no exterior ou repatriados por residentes ou domiciliados no país – RERCT a possibilidade de anistia de crimes de lavagem de dinheiro e sonegação fiscal.

Na esteira dessa questão, a Secretaria da Receita Federal do Brasil publicou diversos esclarecimentos sobre esses dispositivos visando melhor orientar os interessados em regularizar seus ativos no exterior que, em princípio, visariam a facilitar a operação.

Importante destacar que somente poderão ser regularizados: – bens e direitos provenientes de atividades permitidas e não proibidas por essa lei e – o objeto, o produto ou o proveito dos crimes previstos expressamente na legislação que instituiu essa possibilidade de repatriação de ativos irregulares no exterior.

Recentemente, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, por meio do Parecer PGFN/CAT 1.035/16, orientou expressamente que a base de cálculo para apuração de imposto devido e da multa deverá abranger os ativos consumidos em data anterior a 31/12/14, causando grande comoção entre os interessados nessa anistia.

Essa interpretação implicará, em alguns casos, a inviabilidade de adesão ante a indisponibilidade de numerário suficiente, inclusive, de ordem interna para honrar os compromissos financeiros incidentes sobre ativos consumidos antes de 31/12/14.

Dita situação equivale àquela em que o credor de uma massa falida busca patrimônios existentes em nome de sócios já insolventes após decretação da quebra de seu negócio. Ou seja, não obterá resultados.

Tal postura certamente implicará no aumento do contencioso no âmbito penal e tributário com reduzidas chances de satisfação do crédito tributário em virtude da incapacidade de arcar com esse ônus financeiro, sem mencionar o custo para manutenção desses processos.

Nunca é demais lembrar a demanda emergencial por recursos para equilíbrio das contas públicas em função do déficit fiscal superior a cento e setenta bilhões de reais previstos para esse ano, conforme dados divulgados pelo próprio Governo Federal.

Diversos países estimularam a repatriação de ativos mantidos ilegalmente no exterior como forma de ampliar recursos no país, conforme visto na Itália – que arrecadou algo em torno de cem bilhões de euros – e mais recentemente na Argentina que impôs taxa significativamente inferior à brasileira.

A interpretação relativa à “repatriação” de recursos consumidos antes de 31/12/14, gera insegurança visto que da perspectiva que se deseja adotar a interpretação da norma, segundo tal perspectiva, permitirá, eventuais questionamentos futuros.

Isso porque o texto sancionado pelo Poder Executivo menciona expressamente no caput do artigo 4º da Lei 13.254/16 como base de cálculo o saldo existente em 31/12/14 sem qualquer margem de extensão desse período.

Enquanto isso, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional defende a tese de elasticidade do período e a consequente majoração da base de cálculo conforme inteligência do inciso V do artigo 4º da Lei do RERCT.

A despeito das orientações emitidas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional importante destacar novamente a finalidade do RERCT, qual seja: anistiar crimes de lavagem de dinheiro, sonegação fiscal através da repatriação de ativos existentes no exterior e incentivar o ingresso de recursos.

Enfim, esse incentivo, a segurança jurídica, que se pretendia, nada obstante a indiscutível importância dessa medida para a recuperação da economia, requer análise profunda para avaliação da conveniência de adesão voluntária ou não ao RERCT sob a ótica penal e tributária e potenciais efeitos secundários.

Por Roberto Goldstajn
Advogado em São Paulo

Fonte: Jota

Nenhum comentário:

Postar um comentário