Guilherme Queiroz
Em 22 de junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os assalariados passarão a contar com aviso prévio não mais de 30 dias, mas por um período proporcional a seu tempo de serviço. Assim, quanto mais tempo de casa tiver, maior será sua indenização, caso seja demitido. As regras para as novas demissões serão definidas quando os ministros voltarem do recesso do Judiciário, em 3 de agosto, para encerrar uma causa que encabeça uma extensa lista de assuntos com impacto na economia, e que estão prontos para ir a julgamento no STF. Tais temas, mais do que disputas trabalhistas, podem abalar a saúde fiscal do governo ou de setores importantes da economia.
As entidades empresariais ainda não calcularam os efeitos do aumento do aviso prévio, mas um mapeamento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) mostra que há 114 casos com potencial de danos aos cofres públicos, dos quais 66 envolvem disputas tributárias. Somente quatro dessas causas podem criar um rombo de R$ 203 bilhões nas contas federais, em caso de derrota da União no STF. Um cenário que o governo se mobiliza para evitar, já que a decisão do Supremo é a palavra final e não pode ser revertida.
Os casos com elevado potencial de dano às contas públicas formam o “esqueleto fiscal” que está em análise no Supremo. Um deles inspira cuidados especiais no governo, tanto pelos valores envolvidos quanto pela falta de informações sobre a tendência de voto da maioria dos 11 ministros do STF. Ele responde pelo nome de ADC nº 18 (ação declaratória de constitucionalidade) e nela a União busca legitimar a cobrança de Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sobre os créditos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Envolve um bolo de R$ 89,4 bilhões que a União, caso seja derrotada, terá de restituir ao contribuinte, incluindo o setor produtivo. “É o processo que mais nos preocupa e pode ir a julgamento neste ano ou no início de 2012”, disse a procuradora Cláudia Trindade, coordenadora de atuação judicial da PGFN no Supremo.
Apesar dos riscos para o equilíbrio fiscal nos casos pendentes, nas ações julgadas até agora, o governo é quem tem obtido vitórias contra o contribuinte. Nas 22 ações com grande impacto tributário, julgadas entre 2008 e 2010, a União sofreu apenas uma derrota: no ano passado, o STF considerou inconstitucional o recolhimento de contribuição previdenciária sobre produtor rural pessoa física. Segundo especialistas, o governo conseguiu convencer os ministros do Supremo ao acentuar os riscos que uma derrota da Fazenda Nacional traria para o equilíbrio do caixa da União. “O Supremo tem se mostrado sensível ao argumento”, diz o advogado Gilberto Luiz do Amaral, diretor do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT).
Por outro lado, as vitórias têm livrado a União de arcar com restituições que teriam efeito de derrubar a arrecadação. Ou seja, a Justiça tem declarado legais impostos cujos valores as empresas acreditam ter pago indevidamente. É o caso da decisão que extinguiu, em 2010, o crédito-prêmio do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do qual os importadores pediam restituição de R$ 192 bilhões. Graças ao ganho de causa dado pelo STF, a União não precisou desembolsar essa dinheirama. O elevado impacto sobre as contas públicas também pode ser explicado pela demora do Supremo em julgar os casos, já que os valores são corrigidos. O rombo da ADC nº 18, por exemplo, já foi revisado duas vezes, e passou de R$ 60 bilhões para R$ R$ 76 bilhões, e agora para R$ 89,4 bilhões.
Isso acontece, segundo especialistas, porque os ministros não têm prazo para colocar os casos na pauta de votação. Por outro lado, a União tem privilégios na instrução dos processos, o que deixa o contribuinte em desvantagem. As causas arbitradas pelo Supremo não mobilizam apenas a União. Estados e municípios também podem sofrer o impacto das decisões judiciais. A principal delas é o julgamento da ação que pede a inconstitucionalidade da Emenda 62, que alterou o regime de pagamento de precatórios. Os valores explicam a preocupação: são 5,6 mil entidades devedoras, com 280 mil títulos que somam R$ 100 bilhões em débitos. “É um valor gigante e os maiores devedores são as prefeituras”, disse Paulo Ziulkosky, presidente da Confederação Nacional dos Municípios.
Só a Prefeitura de São Paulo, por exemplo, é titular de uma dívida estimada em R$ 24 bilhões. Outra briga frequente, segundo ele, é contra leis aprovadas pelo Congresso que estabelecem pisos nacionais para categorias profissionais. Como a que criou a remuneração mínima para os professores e vem sendo questionada por prefeitos e governadores, no STF. “O Congresso vota de forma irresponsável que quem assume a conta são as prefeituras”, diz Ziulkosky. “E não há como pagar.”
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