segunda-feira, 13 de outubro de 2014

13/10 Operação Concorrência Leal II - Ilegitimidade da Notificação Fiscal

A Secretaria da Fazenda de Santa Catarina já iniciou a segunda edição da Operação Concorrência Leal, que, assim como a primeira, deflagrada no final de 2012, tem por objetivo a apuração de inconsistências ou divergências com relação ao ICMS devido pelas microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional, independentemente do tipo de atividade exercida, com exceção daquelas que prestam serviços de comunicação e de transportes interestadual e intermunicipal.

Assim, os contribuintes enquadrados nessa operação massiva devem ficar atentos aos procedimentos adotados pela Fazenda Estadual, para verificar sua conformidade com os princípios e as normas que regem o Sistema Tributário Nacional.

Dentre os diversos aspectos fiscalizados no âmbito da Operação Concorrência Leal II, o que mais vem ocasionando receio na classe contábil é a questão da rotação de estoques.

A fiscalização, com base no art. 49, inc. IV, da Lei nº 10.297/96 e no art. 75, inc. IV, do Regulamento do ICMS de Santa Catarina – RICMS/SC-01, está aplicando o chamado “índice médio de rotação de estoques” para presumir a ocorrência do fato gerador, isto é, a existência de operações tributáveis não registradas, e para arbitrar a base de cálculo do respectivo imposto, a partir do número de vezes que o estoque de cada contribuinte deveria ter rodado, segundo aquele índice.

O uso do “índice médio de rotação de estoques” para a presunção do fato gerador e o arbitramento da base de cálculo é evidenciado na própria Cartilha elaborada pela Secretaria da Fazenda, conforme os seus itens 6 e 18.

Com efeito, o “índice médio de rotação de estoques” expressa a média de rodadas, em certo período de tempo, dos estoques das empresas de determinado segmento econômico em dada região, que a Fazenda Estadual elegeu como o Município.

Os agentes fiscais presumem a ocorrência de omissão de receitas a partir da comparação entre o giro do estoque de cada contribuinte e o giro médio dos estoques das empresas do mesmo ramo localizadas no mesmo Município, entendendo, no caso de o índice individual ser menor do que a rotação média, que houve omissão de operações tributáveis, com o consequente lançamento do ICMS relativo a esta diferença entre os índices.

Contudo, a previsão do “índice médio de rotação de estoques” na legislação estadual viola os princípios da isonomia tributária e da capacidade contributiva, pois enseja tributação equivalente para empresas em situações distintas.

É ilegítimo pretender tributar em igual medida todas as empresas do mesmo segmento econômico em dado Município com base na média de rotação de estoques, pois, dentro deste conjunto, certamente existe disparidade quanto ao volume de vendas.

Não é porque se tratam de concorrentes que todas venderam em similar quantidade. Pelo contrário, se umas venderam mais, é porque outras venderam menos, com a consequente diversidade de capacidade contributiva. Essa é a dinâmica do mercado, marcada pela acirrada disputa por clientes.

Portanto, a legislação estadual criou uma presunção de vendas que confronta com a real capacidade de contribuição das empresas, devendo ser reconhecida a sua inconstitucionalidade.

Para tentar escapar ao reconhecimento do vício por violação aos princípios da isonomia tributária e da capacidade contributiva, a Secretaria da Fazenda, desde a divulgação da Cartilha da Operação Concorrência Leal II, destacou que, na apuração do “índice médio de rotação de estoques”, levaria em consideração não só o ramo de atuação e a região, mas, também, diferentes faixas de faturamento.

Ocorre que o faturamento não está previsto na Lei nº 10.297/96 nem no RICMS/SC-01 como critério de apuração do referido índice.

Ademais, a consideração do faturamento não evita distorções tributárias, pois, a depender da margem de lucro praticada por cada empresa, dado faturamento não expressa uma mesma frequência de rotação de estoques. Faturamento e volume de vendas não guardam, necessariamente, uma proporção direta.

Deve-se considerar, ainda, que o faturamento é dado sobre a situação econômica ou financeira dos contribuintes, estando protegido pelo sigilo fiscal. Logo, o caso é de cerceamento de defesa, haja vista a impossibilidade da liberação pela Fazenda Estadual dos valores de faturamento das empresas consideradas na apuração do índice, inviabilizando o controle do enquadramento nas diferentes faixas de faturamento.

Jamais se poderá admitir que seja presumida a ocorrência do fato gerador com base em índice que está fora do alcance dos contribuintes, bem como que este índice interfira diretamente sobre o arbitramento da base de cálculo do tributo.

O “índice médio de rotação de estoques” afronta, também, o princípio da legalidade tributária, já que a sua fórmula não se encontra prevista em lei, ficando configurada a delegação da fixação de critério da base de cálculo à Administração Tributária.

Tendo em vista que o “índice médio de rotação de estoques” desconsidera as particularidades de cada empresa que refletem direta ou indiretamente sobre a rotação do seu estoque, é evidente que não observa a natureza casuística do arbitramento, que é incompatível com a utilização de números relativos a outros contribuintes.

Não há dúvidas, enfim, quanto à ilegitimidade da previsão e do emprego do “índice médio de rotação de estoques”, seja para a presunção da ocorrência do fato gerador, seja como elemento do arbitramento da base de cálculo do ICMS, sendo viável a discussão administrativa e judicial das Notificações Fiscais fundadas neste índice, inclusive com precedente favorável aos contribuintes já proferido pelo Judiciário.

FERNANDO TELINI, advogado tributarista, OAB/SC 15.727.
LUCIANNE COIMBRA KLEIN, advogada tributarista, OAB/SC 22.376.
TELINI ADVOGADOS ASSOCIADOS OAB/SC 625/0

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