sexta-feira, 31 de outubro de 2014

31/10 A nova sistemática de recursos trabalhistas

A atuação dos advogados da área trabalhista tende a ficar mais complexa após a sanção da Lei nº 13.015, que entrou em vigor em setembro. Isso porque o novo texto ao otimizar os processos, restringindo o uso de recursos protelatórios, impôs alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Até então, o rito recursal trabalhista era mais simplificado que os demais ritos processuais. Agora tornou-se mais técnico. Com isso, boa parte dos advogados deve encontrar dificuldade para entender a nova legislação. Os problemas podem surgir, principalmente, nas situações em que a lei trabalhista terá de ser aplicada em conjunto com o Código de Processo Civil (CPC) – necessidade que se tornou real, já que o processo trabalhista, com normas escassas, precisou corrigir as lacunas legislativas, aproximando-o do tecnicismo da lei processual civil. A partir de agora, em matéria recursal, o advogado precisará conhecer de forma mais aprofundada as normas celetistas e os dispositivos da lei adjetiva civil, tendo em vista que a Lei nº 13.015/14 determina a aplicação de normas previstas no CPC em diversos recursos trabalhistas, como embargos de declaração e agravos de instrumento.

O intuito maior das inovações trazidas pela lei é sedimentar o entendimento dos tribunais acerca das matérias divergentes, ao mesmo tempo unificando o posicionamento e impedindo a apreciação de recursos que contrariem alguma manifestação já sedimentada na última instância da Justiça do Trabalho. Nesse sentido, a Lei nº 13.015/2014 sugere que o posicionamento firmado pelos ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST), sobre um tema específico, deverá ser seguido pelos tribunais regionais. Desse modo, ao suscitarem uma divergência de entendimento jurisprudencial, como hipótese de cabimento de um recurso, os advogados precisarão indicar qual trecho da decisão recorrida fere a jurisprudência ou súmula defendida. Do contrário, seu recurso será trancado ou não será conhecido pelo tribunal. Com a nova lei, também passa a ser obrigatório à parte recorrente "expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte".

O que se extrai dessas modificações é a necessidade, cada vez maior, de que advogados se qualifiquem

Convém destacar que não é uma questão nova ao advogado trabalhista militante a exigência de indicação precisa da parte da decisão recorrida, na qual se sustenta o inconformismo de quem recorre, bem como a demonstração do dispositivo tido por contrariado. A Instrução Normativa nº 23, de 2003, do TST já impunha, ainda que de forma menos rigorosa, essa exigência de maior técnica nos chamados recursos de revista. Mas, por se tratar de uma instrução, não ganhou a repercussão esperada pela Corte, e a técnica esperada após a sua vigência continuou sendo ignorada nos recursos apresentados. Daí a ideia de alterar o próprio corpo da CLT, concretizada na nova lei.

A maior novidade trazida pela Lei nº 13.015/14, no entanto, diz respeito à aplicação do incidente de uniformização de jurisprudência pelos tribunais trabalhistas. A nova lei passa a importar o incidente já utilizado no processo comum, ao alterar o artigo 896, parágrafo 3º, da CLT, determinando que "os Tribunais Regionais do Trabalho procederão, obrigatoriamente, à uniformização de sua jurisprudência e aplicarão, nas causas da competência da Justiça do Trabalho, no que couber, o incidente de uniformização de jurisprudência", como previsto no capítulo 1, título IX, do livro 1, do CPC.

Pode-se citar ainda, como modificações relevantes trazidas pela Lei nº 13.015/14, a dispensa do depósito recursal para agravo de instrumento, quando este tiver por finalidade "destrancar recurso de revista que se insurge contra decisão que contraria a jurisprudência uniforme do Tribunal Superior do Trabalho". Outro aspecto relevante é que o TST terá que rever suas decisões firmadas em julgamento de recursos repetitivos, quando elas afetarem a situação econômica, social ou jurídica. Essa medida tem como objetivo garantir a segurança jurídica das relações pactuadas pela decisão anterior, uma vez que decisões desta ordem podem impactar milhões de pessoas, a exemplo daquelas envolvendo poupança e FGTS.

O que se extrai dessas modificações é a necessidade, cada vez maior, de que advogados se qualifiquem e sejam mais precisos em suas peças recursais. A realidade tem mostrado que os recursos que exigem mais técnica não são tão utilizados pelas partes. Em verdade, tais apelos de natureza eminentemente jurídica costumam ser mais usados por advogados de empresas. Como exemplo disso, basta dizer que o número de recursos de revistas interpostos – que exigem maior reconhecimento das técnicas recursais – é consideravelmente inferior ao número de recursos ordinários que chegam nos tribunais regionais.

Tais inovações, por atingirem a praxe simplista adotada no manuseio da maioria dos instrumentos processuais trabalhistas, carecem de regulamentação do Tribunal Superior do Trabalho, a fim de elucidar seus conceitos e esmiuçar de forma sistemática a nova modelagem de tramitação dos apelos e incidentes previstos. Afinal de contas, as alterações promovidas, ainda que bem-vindas para desafogar o Judiciário, não devem perder de vista o ideal maior de efetividade da Justiça, que é preservar a eficácia do crédito trabalhista, intimidando medidas protelatórias, sem, por outro lado, deixar de assegurar a garantia constitucional de livre acesso ao Judiciário.

por Silvia Correia é mestre em direito econômico, professora de direito material e processual do trabalho e procuradora da Infraero na área trabalhista

Fonte: Valor Econômico. 

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