terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

14/02 Normas para a fiscalização ambiental


A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a competência comum para União, Estados e municípios de fiscalização das atividades lesivas ao ambiente e expôs que uma lei complementar fixaria normas para a cooperação entre os entes federados.
Sem a norma regulamentadora, contudo, até a publicação em 12 de dezembro de 2011, da Lei Complementar nº 140, a atuação administrativa estatal, "lato sensu", permaneceu em um hiato normativo sobre o tema da sobreposição de autuações ambientais por mais de um órgão ambiental sobre a mesma empresa.
As controvérsias, não raras, tornavam-se casos concretos para deslinde no Poder Judiciário que deveria responder a algumas perguntas como: quem era o órgão competente para licenciar tal empreendimento? Quem, então, era o órgão competente para fiscalizar o empreendimento, embargar e lavrar autos de infração?
Cite-se um julgado da Justiça Federal de Santa Catarina que, em 2005, decidiu que se uma obra ou atividade estivesse licenciada por um órgão ambiental, outro órgão não poderia embargar ou discordar da licença emitida. O licenciamento ambiental sendo ato administrativo que é, dispõe de presunção de legitimidade, não podendo ser anulado por outro órgão da administração, a não ser ele próprio, ou sob mandamento judicial que declare a nulidade.
Mormente que a Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, de 1981, tenha dito que a construção, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, bem como os capazes de causar degradação ambiental dependam de autorização do órgão estadual competente, a Resolução Conama nº 237, de 1997 regulamentou que a definição das competências era fundada na predominância do interesse com base nos impactos ambientais da atividade ou empreendimento.
O licenciamento ambiental não pode ser anulado por outro órgão.
Assim, o Ibama licenciaria obras com impacto nacional ou regional, considerando exame técnico dos Estados ou municípios em que se localizar a atividade ou obra. Ou seja, fora isso, o Ibama tinha sua competência supletiva, podendo agir em qualquer caso, desde que o órgão originariamente competente se omitisse ou falhasse. O Estado era regra de competência e os municípios, quando habilitados pelos Estados, se responsabilizariam pelos impactos locais.
O Parecer nº 312 da consultoria jurídica do Ministério do Meio Ambiente, de 2004, que discorreu sobre o conflito de competência para licenciamento ambiental, opinou que o critério usado para a definição da competência não decorria do regime constitucional dos bens, pois a licença ambiental é um instrumento de gestão ambiental repartida entre os três níveis de governo. O critério adotado, assim, já era a extensão do dano ambiental e não o domínio do bem a ele correlato.
Isso significa que seria competente para licenciar, segundo o MMA, o órgão cuja extensão do dano afetasse bem de seu interesse. Mesmo assim, nunca foi tarefa fácil separar o que seja de interesse local, do que não seja de interesse regional e, por consequência, nacional.
Isso tudo de lado, agora a Lei Complementar, finalmente, regulamentou como se dará a cooperação entre os órgãos do Sistema Nacional de Meio Ambiente, de modo que a regra é que tem competência para fiscalizar aquele órgão que o tem também para licenciar.
A lei definiu que a atuação supletiva é a ação do ente federado que substitui o ente federativo originariamente detentor das atribuições em certas ocasiões, enquanto que a atuação subsidiária é a ação do ente da federação que visa auxiliar o desempenho das atribuições decorrentes das competências comuns, apenas quando solicitado pelo órgão competente.
Algumas atividades podem, dessa forma, ser delegadas ou executadas por meio de convênios, acordos de cooperação técnica, desde que o órgão destinatário tenha estrutura: técnicos próprios ou consorciados devidamente habilitados em número compatível com a demanda. Por essa definição, podemos imaginar que para atingirem o status de "órgãos capacitados", alguns ainda tenham que percorrer um longo caminho.
Nos casos em que o órgão competente não expeça a licença ambiental no prazo legal, instaura-se a competência supletiva de outro órgão para que este expeça a licença e exerça o poder de polícia sobre a atividade ou obra, sendo que os órgãos licenciadores devem observar os prazos estabelecidos para a tramitação e fazer, caso seja preciso, as exigências de complementação oriundas da análise do processo apenas uma vez - salvo fatos novos que possam influenciar na obra ou atividade.
A referida lei se aplica apenas aos processos de licenciamento e de autorização ambiental iniciados a partir de 12 de dezembro do ano passado. Além do reforço de assessoria jurídica que terá que desenvolver o primeiro setor para cumprir a lei, o mesmo se diga para o segundo setor, o produtivo, para entender em que contexto seus projetos de licenciamento ambiental estão entrando nos órgãos, até para saber qual será o competente, bem como para entender seus direitos frente à atividade fiscalizatória estatal.
 por Camila Gessner, advogada especializada em direito ambiental e urbanístico / artigo publicado no jornal Valor Econômico

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