quinta-feira, 16 de março de 2017

Prova documental

Continuando os nossos estudos sobre a fase instrutória ou probatória, hoje tratarei sobre a prova documental.

Documento é a prova histórica real, consistente na representação física de um fato. Em sentido lato, documento compreende não apenas os escritos, mas também desenhos, pinturas, mapas, fotografias, gravações sonoras, filmes, por exemplo.

O documento público, ou seja, aquele formado e lavrado por escrivão, chefe de secretaria, tabelião ou servidor público, faz prova não só da sua formação, mas também dos fatos que tais pessoas declararem ocorridos em sua presença (art. 405, CPC/2015). A presunção de veracidade do documento público se restringe à parte extrínseca do documento, isto é, à formação e à autoria das declarações. Por exemplo, a escritura pública faz certo, até prova em contrário, que a parte prestou as declarações registradas pelo tabelião. Não implica, porém, a veracidade obrigatória dos fatos que a parte declarou.

O ordenamento jurídico processual admite uma infinidade de provas, porém, naquelas em que a lei exigir, como da substância do ato, o instrumento público, nenhuma outra prova, por mais especial que seja, pode suprir-lhe a falta (art. 406, CPC/2015). Em outras palavras, exigindo a lei documento público para a prova do ato, é impossível suprir a falta com outra espécie de prova, ao contrário do que ocorre quando o ato puder ser provado por documento particular, porquanto pode ser complementado com prova testemunhal (art. 444, CPC/2015).

O documento, feito por oficial público incompetente, ou sem a observância das formalidades legais, sendo subscrito pelas partes, tem a mesma eficácia probatória do documento particular (art. 407, CPC/2015).

Tratando-se de documento particular, a declaração presume-se verdadeira em relação ao signatário e não perante terceiros (art. 408, CPC/2015). Contestada a assinatura do documento particular, cessa-lhe a fé, independentemente da arguição de falsidade, cabendo o ônus da prova, nesse caso, à parte que produziu o documento (art. 429, II, CPC/2015).

A prova documental pode ser produzida em qualquer fase processual, inclusive em grau de recurso, “desde que ouvida a parte contrária e inexistentes o espírito de ocultação premeditada e de surpresa de juízo” (REsp 795.862). Apenas os documentos que constituem pressuposto da causa devem acompanhar a inicial. O disposto no art. 434 do CPC/2015 segundo o qual “incumbe à parte instruir a petição inicial ou a contestação com os documentos destinados a provar suas alegações”, constitui mero anseio do legislador. Prova disso é que a lei permite a juntada posterior de documentos quando impossível a sua apresentação na petição inicial ou na contestação (art. 435, parágrafo único, CPC/2015).[1]

Apresentada a prova documental (na petição, na contestação ou mesmo na fase recursal), a parte contrária poderá adotar quaisquer das providências do art. 436, CPC/2015, quais sejam: (i) impugnar a admissibilidade da prova documental, isto é, negar-lhe o valor de prova por violar o art. 369; (ii) impugnar a autenticidade, ou seja, contestar a autoria do documento; (iii) manifestar-se sobre o documento sem, necessariamente, impugná-lo; ou (iv) suscitar a falsidade do documento, cabendo-lhe decidir se utilizará ou não o incidente processual de arguição. Com efeito, pode a parte impugnar documento que seja evidentemente falso, sem que haja necessidade do incidente processual, que tornaria mais longo o processo. Ainda assim, não será admitida alegação de falsidade genérica, pois ao impugnante incumbe apontar especificamente a irregularidade.

Como fecho deste resumido texto, transcrevo um julgado do STJ, que trata do momento para apresentação da prova.

 “A determinação do juiz para que se desentranhe prova documental dos autos em razão de sua juntada intempestiva, por si só, não inviabiliza o conhecimento da referida prova pelo Tribunal, desde que seja observado o princípio do contraditório. O art. 397 do CPC prevê as exceções à regra de que a prova documental deve acompanhar a petição inicial e a contestação, dispondo que ‘é lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados, ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos’. A interpretação do referido dispositivo tem sido feita de forma ampliativa, de modo a admitir que a juntada de documentos novos ocorra em situações não formalmente previstas, relativizando a questão sobre a extemporaneidade da apresentação de prova documental, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da ação e não haja má-fé na ocultação do documento, razão pela qual se impõe a oitiva da parte contrária (art. 398 do CPC). Dessa forma, a mera declaração do juiz de que aprova documental é intempestiva e, por isso, deve ser desentranhada dos autos não é capaz de, por si só, impedir o conhecimento da referida prova pelo Tribunal, tendo em vista a maior amplitude, no processo civil moderno, dos poderes instrutórios do juiz, ao qual cabe determinar, até mesmo de ofício, a produção de provas necessárias à instrução do processo (art. 130 do CPC)”[2] (STJ, REsp 1.072.276/RN, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 21.02.2013).

[1]  Posição que se alinha ao entendimento jurisprudencial. Nesse sentido: “[…] A juntada de documentos, em fase de apelação, que não se enquadram naqueles indispensáveis à propositura da ação e apresentam cunho exclusivamente probatório, com o nítido caráter de esclarecer os eventos narrados, é admitida, desde que garantido o contraditório e ausente qualquer indício de má-fé, sob pena de se sacrificar a apuração dos fatos sem uma razão ponderável […]” (STJ, REsp 1.176.440/RO, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 17.09.2013).
[2] O acórdão refere-se aos artigos do CPC de 1973, que correspondem, respectivamente, aos arts. 435, 437, § 1º, e 370 do novo CPC.

Elpídio Donizetti
É jurista, professor e advogado. Membro da Comissão de Juristas do Senado Federal responsável pela elaboração do anteprojeto do Novo Código de Processo Civil. Mestre em Direito Processual Civil. Doutor em Ciências Jurídicas e Sociais. Pós-Doutor em Direito. Fundador do Instituto Elpídio Donizetti e do Escritório Elpídio Donizetti Advogados.

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