quinta-feira, 16 de março de 2017

Imunidade de contribuição social às entidades beneficentes na atual jurisprudência do STF

A Seguridade Social é sistema de proteção amplo, que abrange a Previdência Social, a Saúde e a Assistência Social.

O seu custeio é realizado principalmente de forma direta, ou seja, por meio de contribuições sociais, embora também indiretamente, isto é, com a utilização de recursos dos orçamentos fiscais dos entes políticos (art. 195 da Constituição da República).

As contribuições para a Seguridade Social são modalidades de contribuições sociais, as quais têm natureza tributária[1].

Prevalece, assim, o entendimento de que as contribuições para a Seguridade Social são tributos, uma vez que previstas no art. 149 da Constituição da República, o qual dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional, o que é confirmado pela Súmula Vinculante 8 do STF, ao prever que são “inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do Decreto-Lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”.

Observados esses aspectos, nos termos do art. 195, § 7º, da Constituição da República, são isentas de contribuição para a Seguridade Social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

Na realidade, a hipótese é de imunidade, por se tratar de previsão constitucional que exclui a incidência da mencionada contribuição social.

Apesar dessa disposição específica, que faz expressa remissão à lei, o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a questão sobre a reserva de lei complementar para instituir requisitos à concessão de imunidade tributária, quanto a contribuições sociais, às entidades beneficentes de assistência social, conforme art. 195, § 7º, da Constituição Federal de 1988, fixou a seguinte tese de repercussão geral: “Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar” (STF, Pleno, RE 566.622/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 23.02.2017).

Nesse contexto, nas ADIs 2.028 e 2.036, o Supremo Tribunal Federal conheceu das ações diretas como arguições de descumprimento de preceito fundamental e, no mérito, julgou procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 9.732/1998, na parte em que alterou a redação do art. 55, inciso III, da Lei 8.212/1991 e acrescentou-lhe os §§ 3º, 4º e 5º, bem como dos arts. 4º, 5º e 7º da Lei 9.732/1998 (STF, Pleno, Redatora para acordão: Min. Rosa Weber, j. 02.03.2017).

Na mesma linha, nas ADIs 2.228 e 2.621, o Supremo Tribunal Federal conheceu das ações diretas como arguições de descumprimento de preceito fundamental e, no mérito, julgou parcialmente procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 2º, inciso IV; 3º, inciso VI, § 1º e § 4º; art. 4º, parágrafo único, todos do Decreto 2.536/1998; assim como dos arts. 1º, inciso IV; 2º, inciso IV, e § 1º e § 3º; e 7º, § 4º, do Decreto 752/1993 (STF, Pleno, Redatora para acordão: Min. Rosa Weber, j. 02.03.2017).

A respeito do tema, o art. 146, inciso II, da Constituição da República prevê que cabe à lei complementar regular as “limitações constitucionais ao poder de tributar”, como seria o caso das imunidades.

Com isso, até a aprovação de lei complementar a respeito, seguindo-se a posição que prevaleceu no STF, seria aplicável o art. 14 do Código Tributário Nacional, ao prever a necessidade de observância dos seguintes requisitos pelas entidades favorecidas: I – não distribuírem qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; II – aplicarem integralmente, no País, os seus recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; III – manterem escrituração de suas receitas e despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.

Frise-se que, na atualidade, a Lei 12.101/2009 dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de Assistência Social e regula os procedimentos de isenção de contribuições para a Seguridade Social.

O art. 44 da Lei 12.101/2009 revogou, entre outros, justamente o art. 55 da Lei 8.212/1991, bem como o art. 1º da Lei 9.732/1998, na parte que altera o art. 55 da Lei 8.212/1991, os quais foram considerados formalmente inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, ao decidir que a matéria relativa à imunidade, inclusive quanto às contribuições sociais, no caso de entidades beneficentes de assistência social (art. 195, § 7º, da Constituição da República), é reservada à lei complementar.

A rigor, sabendo-se que a norma especial deve prevalecer em face da norma geral, nota-se que o art. 195, § 7º, da Constituição Federal de 1988, ao tratar especificamente sobre a imunidade das entidades beneficentes de assistência social quanto às contribuições para a Seguridade Social, exige o atendimento de condições a serem “estabelecidas em lei”, a qual poderia ser entendida como lei ordinária.

Nas hipóteses em que a Constituição da República exige lei complementar para versar sobre certas matérias, isso é feito de modo expresso, como se observa no próprio art. 146, o qual, entretanto, poderia ser entendido como norma geral relativa ao Sistema Tributário Nacional.

De todo modo, como a Lei 12.101/2009 é ordinária, cabe acompanhar os efeitos dos referidos julgados do STF sobre essa relevante matéria, mais especificamente quanto ao mencionado diploma legal em vigor, pois embora não tenha sido abrangido expressamente pelas decisões indicadas, também não foi aprovado como lei complementar.

[1]  Cf. GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Curso de direito da seguridade social. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017. p. 98-100.

Gustavo Filipe Barbosa Garcia
é professor Universitário e livre-docente pela Faculdade de Direito da USP.

Nenhum comentário:

Postar um comentário