terça-feira, 7 de julho de 2015

07/07 Compliance – Uma visão americana

Muito tem sido dito sobre programas de compliance e, para os efeitos desta nota, compliance concorrencial. Tais programas têm cunho educacional para que os funcionários da empresa ou entidade evitem incorrer em infrações contra a ordem econômica – entre as quais se destaca o cartel – desta forma evitando a aplicação de sanções administrativas pecuniárias e criminais.

Um programa de compliance efetivo e bem aplicado obviamente deve evitar que a empresa e seus executivos participem de um cartel mas, se algo der errado, é importante saber como a autoridade vai encarar a existência do programa de compliance, ou seja, se a autoridade vai reconhecer a sua existência e considerá-lo beneficamente no momento da aplicação de eventual sanção.

A esse respeito Brent Snyder, atual cartelbuster do Department of Justice (DoJ) dos Estados Unidos, fez uma exposição em 09.09.2014, em evento conjunto da International Chamber of Commerce e do U.S. Counsil of International Business, em que disse que a primeira verificação da autoridade ocorre no topo da hierarquia. A alta administração (incluindo, se for o caso, os equivalentes do Conselho de Administração e da Diretoria) precisa estar engajada nos esforços da empresa, inclusive no que toca ao fornecimento de meios para a implementação do programa de compliance. Fica claro que este programa não pode ser uma iniciativa isolada do Departamento Jurídico ou do Departamento de Compliance. Se a alta administração leva o tema a sério, é provável que a empresa toda também o faça.

Outro ponto levado em consideração é o alcance, o que significa que o programa de compliance deve permear toda a estrutura da empresa. É preciso que todos os funcionários sejam atingidos pelo programa e possam interagir, pedindo orientação e apontando as eventuais falhas e/ou violações. Muitas empresas, por exemplo, têm canais de comunicação abertos diretamente com os aplicadores do programa, até mesmo permitindo denúncias anônimas. Isso significa que há um requisito de pro atividade.

Mas a parte mais controvertida da exposição de Brent Snyder diz respeito à obrigação, estabelecida pela autoridade norte-americana, da empresa eventualmente condenada despedir ou pelo menos tirar de posição chave qualquer funcionário que tenha levado a empresa a praticar os atos contrários à livre concorrência. Nos casos mais graves, o DoJ sequer deixa ao arbítrio da empresa a escolha do melhor programa de compliance. Isso também ocorre nos acordos de leniência, cujos benefícios aos “culpados arrependidos” têm contrapartidas. De fato, o benefício decorrente de tal acordo só é concedido a quem assume determinados compromissos, inclusive a implantação de programa de compliance efetivo.

O que o DoJ já fez e pode continuar a fazer é a nomeação de monitores de compliance, cuja função é garantir, para o DoJ, que o programa de compliance é eficiente e cumpre a sua finalidade. É certo que a autoridade do DoJ depende sempre da autorização do Poder Judiciário, mas também é certo que este poder costuma referendar a maioria dos pedidos da autoridade concorrencial.

Este é um cenário americano, do qual o Brasil ainda está distante. Mas é preciso saber que há evolução e qual o sentido dessa evolução, lembrando que o próprio direito concorrencial tem matriz americana. Aliás, deve ser lembrado que o acordo de leniência, quando implantado no Brasil, foi alvo de grande polêmica (dizia-se em vários círculos que, como determinadas vacinas, “não pegaria”); hoje é uma realidade. Por isso, é conveniente prestar muita atenção aos sinais que vêm do norte.

por Mauro Grinberg é advogado, sócio do Grinberg Cordovil Advogados. Foi subprocurador-geral da Fazenda Nacional e conselheiro do Cade.

Fonte: Jota

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