terça-feira, 8 de julho de 2014

08/07 Sempre foi assim...

Todas as pessoas têm ideias, umas mais do que outras, claro, mas a maioria não se sente motivada a participar, a contribuir com sugestões, a melhorar o dia-a-dia da empresa onde trabalha, a melhorar as relações internas e as relações com os clientes da organização sem limitar essas participações a determinados departamentos.

Quando as empresas enfrentam alguma crise ou precisam resolver algum problema, geralmente contratam consultores externos em vez de buscar soluções dentro da própria companhia. As empresas estão cheias de pessoas com excelentes ideias, só que essas ideias não são aproveitadas na prática por diversos motivos. Pode ser que a ideia seja fantástica, mas seu criador não tenha atitude, não tenha coragem de mostrá-la, ou talvez a ideia seja de um funcionário que é rejeitado pelos demais, que é excluído dentro da própria organização, pelas mais diferentes razões. Às vezes, por outro lado, a ideia é ótima, mas quem a tem não sabe apresentá-la no momento certo, da maneira certa, para a pessoa certa. Entretanto, na maioria dos casos, o principal problema está exatamente na pessoa que recebe a nova ideia.

É comum que o gerente de um setor, por exemplo, não busque nem aprove novas ideias simplesmente porque elas são capazes de mudar todo o procedimento e a maneira de executar determinadas atividades. Afinal, uma mudança geralmente implica a criação de novas regras, novas condutas, novos mecanismos, novas ações internas e externas e tudo isso dá trabalho e certamente resultará na mudança de posições ou de determinados cargos ou até mesmo em demissões.

Também existe a possibilidade de a ideia não dar certo. A maioria dos diretores e gerentes não quer ter mais trabalho nem correr o risco de assumir a responsabilidade por uma mudança, mesmo que esta seja para facilitar sua própria vida, eliminar entraves, motivar as pessoas do departamento, aumentar a produtividade da empresa, ampliar sua visibilidade e contribuir para que ele cresça na organização.

Se você identifica alguma forma complicada de executar determinada tarefa, pergunta ao gerente do setor: “Por que isso é feito assim?” Ele responde, sem pensar: “Não sei, isso sempre foi feito assim.” Esse gerente está com o freio de mão puxado e também está puxando o freio de mão da empresa.

Macacos condicionados

A resposta dele lembra a história do cientista que pendurou vários cachos de bananas no alto de uma jaula. Nessa jaula, havia cinco macacos e uma escada. Durante a experiência, quando um macaco tentava subir pela escada para pegar as bananas, o cientista jogava uma forte ducha gelada no demais e os macacos ficavam apavorados, enfurecidos, descontrolados, pulando de um lado para o outro. Depois de certo tempo, com a repetição do banho geral em cada tentativa, os macacos passaram a agredir aquele que tentasse subir na escada, até o dia em que todos os macacos desistiram de subir pela escada e abandonaram a ideia de comer as bananas.

Para dar prosseguimento ao teste, um dia o cientista substituiu um dos macacos por outro que não havia passado pela experiência. Assim, quando esse novo macaco tentava subir pela escada, no mesmo instante, levava uma surra dos demais. Naquele momento da experiência, o homem já não jogava mais a ducha fria. Não existia mais mangueira e as bananas estavam lá, à disposição, só que os macacos não chegavam mais perto da escada nem deixavam que o outro subisse.

O cientista passou a substituir um a um, todos os macacos e, cada vez que ele fazia isso, esse outro símio, que não sabia da história da ducha, tentava subir na escada, e era surrado pelos demais. Um dia, finalmente, os cinco macacos do início da experiência tinham sido substituídos.

Mesmo assim, os que estavam na jaula continuavam surrando todo novo indivíduo que tentasse subir na escada. Eles nem sabiam por que agiam daquela maneira; não sabiam que um dia alguém tinha jogado uma ducha gelada em outros macacos. Eles não sabiam de nada, mas não mudavam seu comportamento simplesmente porque naquela jaula aquilo sempre tinha sido feito assim.

Empresas não podem ser jaulas

Neste momento, muitos gerentes, supervisores, superintendentes, chefes em geral, estão parados, feito macacos de laboratório, olhando para as bananas no teto e ignorando todo tipo de escada que apareça. Eles estão paralisados, com medo de mudar o que “sempre foi feito assim”, com medo de apanhar dentro da jaula. Empresas não devem ser jaulas, devem ser janelas e, para abrir janelas no ambiente corporativo, nada como nomear um Diretor de Ideias, o DI.

Além de ter ideias, o DI projeta as ideias dos outros, escuta as ideias dos funcionários. Diretores de Ideias devem ser ombudsmans da criatividade, que recebem as ideias do faxineiro, do gerente, da secretária, de todo mundo, e as levam para o supervisor, o diretor, o presidente, para quem quer que seja. Ele é um catalisador, é uma ponte aberta para receber e processar as ideias de todos os funcionários. Dessa forma, o DI passa a ser um veículo que faz com que as pessoas não tenham constrangimento de apresentar suas ideias a outras de nível hierárquico mais alto.

A porta da sala do Diretor de Ideias tem que estar sempre aberta, 24/7 (vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana). Ele, mais do que todos, é um grande criador de ideias. Ele pensa em ideias o tempo todo.

Diretores de Ideias devem ser mais do que ótimos catadores de soluções e sugestões. Eles precisam, muitas vezes, aperfeiçoar as ideias, readequá-las, interpretá-las, ouvir outras pessoas que somem com suas opiniões.

Ouvir, ouvir, ouvir. Transformar informações úteis em ações concretas.

Contar com um bom Diretor de Ideias pode mudar o destino de uma empresa, mas é preciso refletir sobre esse conceito para aplicá-lo com eficácia.

O DI deve ser o profissional responsável por ouvir as pessoas dentro da empresa. Ele é uma ponte entre todos os setores, todos os departamentos, todas as estruturas da corporação. Na realidade, o DI ouve as críticas e as sugestões de todos os funcionários da organização e também apresenta suas próprias críticas, suas próprias sugestões, suas próprias ideias para todos os setores.

Muitas vezes, esse diretor junta pequenas ideias e as transforma numa só, que pode se tornar grandiosa em todos os sentidos. Por outro lado, ele também é capaz de transformar uma ideia em várias, com desdobramentos inimagináveis, mas absolutamente viáveis e eficazes para melhorar a produtividade da empresa em todos os aspectos.

Com sensibilidade, o DI realmente precisa estar sempre pronto para ouvir todo mundo, mas não basta ouvir, anotar as sugestões e passá-las adiante. O Diretor de Ideias também busca caminhos, saídas, soluções o tempo todo, não só para coisas que estão dando errado, mas também para melhorar ainda mais tudo o que já dá certo. Ele não é simplesmente um anotador de palavras, um catador de sugestões, um passador de opiniões.

Ele traduz as ideias dos outros, enxuga palavras, clareia pensamentos, tira cada grão de areia das engrenagens da empresa. Mais do que isso, o Diretor de Ideias lubrifica as engrenagens da empresa para que ela não emperre, para que não pare.

Cuidar das próprias engrenagens e motivar pessoas é o grande desafio de empresários, industriais, empreendedores, executivos, líderes em geral.

Entender os problemas

Para isso, mais do que nunca, as empresas e organizações têm que olhar para os problemas de forma diferente, têm que recriar conceitos, têm que remodelar a visão das coisas, das situações, dos ambientes, dos objetivos das empresas, das próprias pessoas. Não temos que reinventar a asa, claro, mas, sim, novas maneiras de voar.

Uma empresa pode ter um ou mais Diretores de Ideias. Você pode ter um DI para questões internas, por exemplo, e outro para observar e avaliar ideias externas, da concorrência ou de outros setores, que podem ser reaplicadas na empresa. Sim, o DI deve observar ideias de outras empresas, de outras organizações, mesmo que não sejam do setor, para aperfeiçoá-las ou adaptá-las à sua empresa. Antes de tudo, o DI precisa ser um grande observador, um grande ouvinte, um grande avaliador.

Sua missão é tornar os ambientes cada vez mais propícios ao desenvolvimento e à apresentação das ideias dos funcionários, com soluções para reduzir custos, melhorar o atendimento, dinamizar os serviços, aperfeiçoar os produtos.

As pessoas, na empresa, precisam ganhar cada vez mais confiança, melhorar sua autoestima para criar e participar. Elas podem ir muito mais longe do que imaginam quando descobrem suas próprias potencialidades, quando abrem suas próprias garrafas do gênio, descobrem seus desejos e vão atrás deles, com autoconfiança, arrojo, criatividade e determinação.

Para isso, a empresa deve organizar um amplo concurso de ideias aberto a todos os setores, todos os departamentos, todos os funcionários, sem exceção. Reconhecer, valorizar, prestigiar as pessoas é uma ideia poderosíssima dentro de uma empresa.

Não somente a cúpula da empresa, mas a moça do cafezinho, o estagiário, a recepcionista, o office boy, a responsável pela limpeza, todos têm que estar motivados, têm que estar com vontade de colaborar, têm que estar, acima de tudo, felizes no ambiente de trabalho. O reconhecimento público da ideia do funcionário dentro da organização cria enorme impacto de compromisso deste com a própria empresa; contudo, para conhecer as ideias de todos os funcionários, o DI não deve obrigá-los a se expressar por escrito. Esse é um erro muito comum de chefes dos mais variados departamentos.

Muitas vezes, um funcionário chega para o chefe e diz: “Olha, eu tenho uma ideia para melhorarmos o rendimento de nosso setor.” Aí o chefe diz a ele: “Tudo bem, tudo bem, ponha essa sua ideia no papel e depois deixe em minha mesa, ou me mande por e-mail.” Provavelmente esse chefe esteja assassinando a ideia de seu funcionário, assassinando a possibilidade de uma boa solução para determinado problema, minando os laços de relacionamento entre ele e seu funcionário.

De repente, a ideia do cara pode ser resumida numa frase e o chefe quer que ele ponha essa frase num papel, cheia de preâmbulos, num texto que ainda seja extremamente claro e obediente às regras gramaticais. Se o sujeito tem dificuldade de escrever, se ele tem medo ou inibição de se expressar por escrito, a ideia morre. O DI trabalha para não deixar as ideias morrerem. Ele é o meio de campo de um grande time. É quem faz o elo de ligação entre os jogadores, entre a defesa e o ataque da mesma equipe.

Como um bom meio de campo, ele lança as ideias sob medida para os outros marcarem gols e também faz seus próprios gols, claro. Além disso, o DI precisa ter fôlego para correr por todos os setores do campo. Ele assume a responsabilidade de receber a bola, driblar entraves e repassá-la para os jogadores certos, no momento exato. Com um Diretor de Ideias eficaz, criamos um canal para motivar as pessoas a participarem do processo, apresentando suas ideias dentro da empresa.

Os Diretores de Ideias devem ser os responsáveis por receber, selecionar as melhores ideias e apresentá-las aos responsáveis pelos setores. A empresa precisa divulgar internamente as melhores ideias dos funcionários.

Nesse caso, mais poderoso do que a recompensa econômica é o reconhecimento da empresa de que sua ideia tem valor, de que será aplicada. Isso desenvolve muito a auto-estima das pessoas, faz com que elas se envolvam cada vez mais com a empresa, motiva as outras pessoas a também participar. Valorizar as ideias das pessoas é valorizar as próprias pessoas.

Quem valoriza as pessoas também valoriza a própria empresa.

O grande poder das ideias dentro de uma organização é criar um ambiente, um espírito participativo que demonstre que a empresa valoriza a renovação das ideias e que abre oportunidade para que todos os funcionários apresentem suas opiniões e tenham chances de obter reconhecimento.

Nesse sentido, mesmo quando a ideia de um funcionário não é aprovada, o DI tem que motivar essa pessoa a apresentar novas ideias, quando as tiver. O mais importante é estimular a pessoa a repensar suas ideias e atitudes.

Para nos mantermos no mercado temos que repensar nosso negócio e nossos modelos o tempo todo. A indústria da criatividade dentro das empresas não pode entrar nunca em recessão. Ela precisa estar sempre contribuindo para que superemos nossas adversidades, para que olhemos as coisas de forma positiva, para que melhoremos nossos relacionamentos pessoais, para que as pessoas sintam prazer de estar naquele ambiente de trabalho.

Por isso, temos que dar crédito aos outros, reconhecê-los como pessoas, e não simplesmente usá-los para determinadas tarefas que terminam no final do dia. A criação do cargo de Diretor de Ideias incentiva os funcionários a pensar em ideias no final de semana e a trazer essas ideias para a empresa na segunda-feira, em vez de pensar: “Ah, para que vou levar essa ideia a eles se não vou ganhar nada com isso.” Essa mentalidade tem que acabar porque você não está ajudando só a empresa, você está ajudando a si mesmo. Ninguém ganha uma promoção, você a conquista.

O Diretor de Ideias também tem a missão de aproximar os setores, os pensamentos em torno de objetivos comuns e as pessoas. Ele é o encarregado de tirar os problemas do isolamento, de buscar suas origens e encontrar soluções; de ouvir as pessoas de todos os departamentos, ouvir as críticas e apresentar sugestões. Ouvir todos os lados. Não só ouvir, como também olhar, tatear, farejar, provar as ideias. Como todo profissional que trabalha com projetos, o DI precisa dominar os cinco sentidos.

Os cinco sentidos de um diretor de ideias

1. Visão
No mundo das ideias, geralmente não enxergamos determinadas coisas porque elas estão muito próximas de nós mesmos. Precisamos ficar atentos às pessoas, aos objetos, às situações que estão mais próximas de nós.

Em vez de buscarmos soluções além do horizonte, o melhor é sempre tentarmos achar essas soluções perto de nós. Por outro lado, também precisamos olhar além do horizonte, enxergar lá na frente, enxergar a projeção de uma ideia. Enxergar o que ninguém enxerga.

2. Olfato
Temos que apurar cada vez mais o faro para identificar o cheiro do sucesso e o cheiro do fracasso de uma ideia. Também temos que farejar o cheiro da energia das pessoas que participarão da ideia para sabermos se elas serão capazes de pôr em prática o que pensamos. Sentir o cheiro dessa energia, de fato, é importantíssimo.

3. Paladar
Precisamos provar o gosto das coisas, experimentar coisas novas, provar caminhos diferentes. Há coisas que não temos tempo para provar e que, às vezes, nem precisamos para saber que a ideia é salgada demais ou excessivamente adoçada.

4. Audição
Nada como escutar as pessoas, escutar os impulsos, os valores, os motivos, as reações das pessoas. Escutar os próprios instintos apura o ouvido para as ideias.

5. Tato
É preciso sensibilidade para lidar com as pessoas, mas ter tato não é ser sempre delicado. Às vezes você também tem que ser agressivo para vender sua ideia. Agressividade não significa violência. É uma atitude com personalidade, identidade, força, que não se inibe com oposições, com conspirações que tentam derrubar sua ideia. Ter tato é saber o momento certo de segurar uma ideia com força e o momento certo de suavizar as relações.

A arte da “autodireção”

Do mesmo modo que um DI, precisamos apurar bem nossos cinco sentidos. Para isso, o fundamental é a própria experiência: cometer erros, ser criticado, achar saídas, resolver problemas, trabalhar, trabalhar, trabalhar, derrapar, voltar para a pista, conhecer as pessoas, aprender e reaprender com tudo e com todos. Também temos que desenvolver a arte da autodireção, saber o momento exato de deixar que as ideias nos dirijam, saber o momento exato de dirigir as ideias. Achar o tom da direção, de acordo com a ideia, de acordo com o problema, de acordo com a empresa, de acordo com as pessoas.

por Ricardo Bellino

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